Religião não rima com intolerância – É urgente desarmar os corações

15/01/2015 21:20

            Eu gostaria de compartilhar com vocês um pouco da história das Instituições da Boa Vontade, particularmente da que cuida mais diretamente da sua ortodoxia, a Religião de Deus, do Cristo e do Espírito Santo.

 

            Cumprindo decisão da Assembleia Magna Extraordinária de 6 de outubro de 1973, o saudoso radialista e poeta brasileiro Alziro Zarur (1914-1979), então Presidente-Fundador da LBV, realizou na cidade de Maringá, no Paraná, a Proclamação da Religião de Deus, do Cristo e do Espírito Santo durante o Congresso da Boa Vontade de Deus em 7 de outubro de 1973.

 

            Em 1º de outubro de 1982, eu, José de Paiva Netto, fiz o pedido de registro da Religião de Deus, do Cristo e do Espírito Santo. Oficialmente, em 19 de dezembro de 1983, no Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas, da cidade do Rio de Janeiro/RJ, a entidade foi reconhecida como pessoa jurídica.

 

            E toda vez que o Dia Mundial da Religião é celebrado no Brasil em 21 de janeiro, sinto sobre meus ombros a seriíssima responsabilidade de presidir com sabedoria e competência esta entidade religiosa que veio ao mundo para sublimar mentes e corações no Bem, de modo que enxerguem que a verdadeira harmonia começa no íntimo esclarecido de cada criatura, pelo conhecimento espiritual, pela generosidade e pela justiça. E como ela tem feito isso?

 

Sua missão precípua

 

            Salvar vidas e almas para Deus, pelo conhecimento da Verdade Divina e da prática da Caridade do Novo Mandamento do Cristo Ecumênico (Evangelho segundo João, 13:34 e 35; 15:7, 8, 10 a 17 e 9), aliadas no exercício da Fé Realizante (Fé+Obras) e da Fé que diviniza (o perfeito conhecimento de Deus=Justiça,Amor).

 

Seu objetivo supremo

 

            Preparar os caminhos da Volta Triunfal de Jesus ao planeta que Ele fundou (Evangelho segundo João, 1:1 a 3 e 10) por ordem do Pai Celestial, com a formação do Seu Rebanho Único: Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; a mim me convém conduzi-las; elas ouvirão a minha voz, e haverá um só Rebanho para um só Pastor(Evangelho segundo João, 10:16).

 

            Por sinal, a mídia está repleta das tristezas que se deram a partir de 7 de janeiro de 2015, na França. Milhões e milhões de almas se comovem, nos lares e nas ruas! Muitas são as tentativas de caminhos novos que aplaquem todas essas dores.

            Relendo o meu livro "Jesus, a Dor e a origem de Sua Autoridade", lançado em 8 de novembro de 2014, achei alguns modestos apontamentos, os quais gostaria de apresentar a vocês, que me honram com a leitura.

            Por infelicidade, os povos ainda não regularam suas lentes para enxergar que a verdadeira harmonia começa no íntimo esclarecido de cada criatura, pelo conhecimento espiritual, pela generosidade e pela justiça. Consoante, costumo afirmar, e outras vezes comentarei, eles geram fartura.

 

            A tranquilidade que o Pai Celeste — visto, de lado a lado, sem extremismos e reconhecido como inspirador da Fraternidade Ecumênica — tem a oferecer, em nada se assemelha às frustradas tratativas e ineficazes acordos registrados no mundo. O engenheiro e abolicionista brasileiro André Rebouças (1838-1898) traduziu em metáfora a inércia das perspectivas exclusivamente humanas:

 

            — "(...) A paz armada está para a guerra como as moléstias crônicas para as moléstias agudas; como uma febre renitente para um tifo. Todas essas moléstias aniquilam e matam as nações; é só uma questão de tempo".

            Vivenciar a Paz desarmada, a partir da fraternal instrução de todas as nações, é medida inadiável para a sobrevivência dos povos. Mas, para isso, é preciso, primeiro, desarmar os corações, conservando o bom senso, conforme destaquei aos jovens de todas as idades que me ouviam em Jundiaí/SP, Brasil, em setembro de 1983 (...).

            No dia em que o indivíduo, reeducado sabiamente, não tiver mais ódio bastante para disparar artefatos mortíferos, mentais e físicos, estes perderão todo o seu terrível significado, toda a sua má razão de ser. E não mais serão produzidos.

            É necessário cessar os rancores que insistem em escurecer os corações humanos: desarmar, com uma força maior que o ódio, a ira que dispara as armas. E essa energia poderosa é o Amor — não o ainda incipiente amor dos homens —, mas o Amor de Deus, de que todos nós nos precisamos alimentar. Temos, nas nossas mãos, a mais potente ferramenta do mundo. Essa, sim, é que vai arruinar com todos os tipos de guerras, que, de início, nascem na Alma, quando enferma, do ser vivente.

 

            Os povos discutem o problema da violência no rádio, na televisão, na imprensa ou na internet e ficam cada vez mais perplexos por não descobrir a solução para erradicá-la, apesar de tantas e brilhantes teses. Em geral, procuram-na longe e por caminhos intrincados. Ela, porém, não se encontra distante; está pertinho, dentro de nós: Deus!

            — "(...) o Reino de Deus está dentro de vós". Jesus (Lucas, 17:21).

           
Recordo que em artigo meu, publicado no jornal Folha de S. Paulo, década de 1980, arguido por um leitor sobre o papel evangelizador da Religião na vida de todo ser humano, religioso ou incréu, cristão ou não cristão, ponderei que não vejo Religião como ringues de luta livre, nos quais as muitas crenças se violentam no ataque ou na defesa de princípios, ou de Deus, que é Amor e que, por isso, não pode aprovar manifestações de ódio em Seu Santo Nome nem precisa da defesa raivosa de quem quer que seja. Zarur dizia que o maior criminoso do mundo é aquele que prega o ódio em nome de Deus”.

            Compreendo Religião como Solidariedade, respeito à Vida, iluminação do Espírito, que todos somos. Só posso entendê-la como algo dinâmico, vivo, pragmático, altruisticamente realizador, que abre caminhos de luz nas almas para o uso responsável das novas tecnologias e da internet, e que, por essa razão, deve estar na vanguarda ética. Não a entenderia, se não atuasse também de modo sensato na transformação das realidades tristes que ainda atormentam os povos. Esses, cada vez mais, andam necessitados de Deus, que é antídoto para os males morais e espirituais, por consequência os sociais, incluídos o imobilismo, o sectarismo e a intolerância degeneradores, que obscurecem o Espírito das multidões. (...) E, de maneira alguma, devem-se excluir os ateus de qualquer providência que venha beneficiar o mundo.

            Religião, como sublimação do sentimento, é para tornar o Ser Humano melhor, integrando-o no seu Criador, pelo exercício da Fraternidade e da Justiça entre as Suas criaturas. Já imaginou quando a compreensão das pessoas alçar tal vivência, inclusive na atividade profissional que desempenha? As relações entre o capital e o trabalho mudariam por completo, dando aos profissionais a perfeita noção do que significa misericórdia quero não holocausto; de que é primordial haver políticas públicas que assegurem ao trabalhador igualdade de oportunidades no acesso ao conhecimento e a habilidades, pois quem faz o pão deve igualmente ter direito a ele. Resumindo, para a segurança e o desenvolvimento humanamente sustentado de qualquer organização é essencial, por exemplo, que todos os seus componentes, de alto a baixo, aprendam uma grande ciência: a ciência do diálogo construtivo.

 

            Com apurado senso de oportunidade, preconiza o Profeta Muhammad (570-632) — "Que a Paz e as bênçãos de Deus estejam sobre ele" — no Corão Sagrado: Cremos no que nos foi revelado e no que vos foi revelado. Nosso Deus e vosso Deus é o mesmo. A Ele nos submetemos. Eis a fonte do conhecimento e da paz em sociedade.


Deus, Sabedoria e Entendimento

 

            O Pai Celestial é fonte inesgotável de Sabedoria e Entendimento, quando não analisado sob forma estereotipada ou caricaturada. Vêm-me à lembrança estas palavras de Santa Teresa d’Ávila (1515-1582): Procuremos sempre olhar as virtudes e as coisas boas que virmos nos outros e tapar-lhes os defeitos com os nossos grandes pecados.

            Tudo evolui. Ontem se afirmava que a Terra seria o centro do Universo. Por que então as crenças teriam de parar no tempo? Pelo contrário, Religião, quando sinônimo de misericórdia, tem de iluminar harmoniosamente os demais estratos do pensamento. Bem a propósito esta meditação do nada menos que cético François Marie Arouet, mais conhecido como Voltaire (1694-1778): A tolerância é tão necessária na política como na religião. Só o orgulho é intolerante”. (...)


Para amainar a frieza de coração

 

            Cabe ainda recordar esta máxima abrangente de Zarur: Religião, Filosofia, Ciência e Política são quatro aspectos da mesma Verdade, que é Deus.

            Ora, querer conservar esses ramos do saber universal confinados em departamentos estanques, ou em preconceituoso conflito, tem sido a origem de muitos males que nos afligem, em especial tratando-se de Religião, entendida no mais alto sentido. É principalmente de sua área que deve provir o espírito solidário, que, se às demais faltando, resulta na frieza de sentimentos a qual vem caracterizando as relações humanas, mormente nestes últimos tempos.


Não haverá Paz

enquanto persistirem

cruéis discriminações e

desníveis sociais criminosos

 

            A ausência de Fraternidade tem suscitado grande defasagem entre progresso material e amadurecimento moral e espiritual. Mas é sempre hora de aplacar ressentimentos. Contudo, não haverá Paz enquanto persistirem cruéis discriminações e desníveis sociais criminosos, provocados pela ganância, que, pela eficiente Educação com Espiritualidade Ecumênica, devemos combater.

 

            Se não optarmos por caminhos semelhantes, estaremos sentenciados à realidade denunciada pelo Mohandas Karamchand Gandhi, mais conhecido popularmente por Mahatma Gandhi (1869-1948): Olho por olho, e a Humanidade acabará cega.

            Sempre um bom termo pode surgir quando os indivíduos nele lealmente se empenham. E isso tem feito que a civilização, pelo menos o que vemos por aí como tal, milagrosamente sobreviva aos seus piores tempos de loucura. A sabedoria do Talmud dá o seu recado prático: A Paz é para o mundo o que o fermento é para a massa. Exato.

            Há quem prefira referir-se ao espírito religioso, exaltando desvios patológicos ocorridos no transcorrer dos milênios. (De modo algum incluo nestes comentários os historiadores e analistas de bom senso.) Creio que essa conduta beligerante, que manchou de sangue a História, deva ser distanciada de nossos corações, por força de atos justos, porquanto maiores são as razões que nos devem confraternizar do que as que servem para acirrar rancores. O ódio é arma voltada contra o peito de quem odeia.

 

            Muito oportuna, pois, esta advertência do Pastor Martin Luther King Jr. (1929-1968), que não negou a própria vida aos ideais que defendeu: Aprendemos a voar como os pássaros e a nadar como os peixes, mas não a arte de conviver como irmãos.

            Ademais, o milagre que Deus espera dos Seres Humanos é que aprendam a amar-se, para que não ensandeçam de vez, como na pesquisa para o uso bélico da antimatéria. O melhor altar para a veneração do Criador são Suas criaturas. Torna-se urgente que a Humanidade tenha humanidade.


A virtude da temperança

 

            Em Reflexões da Alma, anotei que não haverá Paz duradoura enquanto prevalecerem privilégios injustificáveis, que desonram a condição humana, pela ausência de Solidariedade, que deve iluminar homens e povos.

 

            Escreveu Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865): A Paz obtida com a ponta de uma espada não passa de uma simples trégua. Por isso, nestes milênios de “civilização”, multidões morreram sob a chacina das armas, da fome e da doença. (...) Jesus sempre pregou e viveu a Fraternidade. Como realmente acreditamos no Divino Chefe, temos de batalhar pelo que apresentou como solução para os tormentos que ainda afligem as nações. A temperança é virtude indispensável nesta peleja. Entretanto, diante dos desafios, não confundamos pacifismo com debilidade de caráter.

 

            Vêm ao nosso encontro estas palavras da autora Eleanor L. Doan: Qualquer pusilânime pode louvar a Cristo, todavia é preciso ânimo forte para segui-Lo. Não podemos também nos esquecer dos exemplos dos cristãos primitivos, mas, sim, neles buscar a vivência que precisa ser repetida neste mundo, qual seja, a da Paz: Da multidão dos que creram, era um o coração e a alma. (...) E assim, perseguidos por todos os meios, passaram a viver em comunidade, não havendo necessitados entre eles, porque todos se socorriam, cada qual com o que possuía (Atos dos Apóstolos de Jesus, 4:32 a 34).

 

            E devemos sempre repetir que o Pai Celestial é Amor! Não o amor banalizado, mas a Força que move os Universos. Lamentavelmente, a maioria esmagadora dos chamados poderosos da Terra ainda não acredita bem nesse fato e tenta em vão desqualificá-lo. Entretanto, "o próximo e último Armagedom mudará a mentalidade das nações e dos seus governantes", afiançava Alziro Zarur (1914-1979).

 

Sobrepujar os obstáculos

 

            O sempre lembrado Zarur dizia, "na verdade, quem ama a Deus ama ao próximo, seja qual for sua religião, ou irreligião". E ele tem razão. Coloquei no meu livro Reflexões da Alma (2003): O coração torna-se mais propenso a ouvir quando o Amor e a Justiça [segundo o entendimento de Deus] são fundamentos do diálogo.
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*José de Paiva Netto é escritor, jornalista, radialista, compositor e poeta. É diretor-presidente das Instituições da Boa Vontade (IBV).